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Pelas Páginas da Literatura 568

Resenha: “Eu que nunca conheci os homens”, de Jacqueline Harpman 605u5k

Nessa distopia, 40 mulheres são mantidas em uma jaula, sem lembrar como foram parar ali

Por Marina Zanaki

21 de janeiro de 2023, às 09h47 • Última atualização em 21 de janeiro de 2023, às 09h48

“Eu que nunca conheci os homens”, da belga Jacqueline Harpman, é um dos livros mais intrigantes que li nos últimos tempos. A autora cria um cenário de distopia onde 40 mulheres são mantidas em uma jaula sem explicação, sem lembranças claras de como foram parar ali, privadas de contato com o mundo exterior e impedidas de se tocarem. O que aconteceu com elas desperta a curiosidade, mas o livro vai por caminhos inesperados.

“Eu que nunca conheci os homens” é contado a partir do relato da única pessoa na jaula que não tem memórias da vida anterior àquela prisão. Chamada apenas de Pequena, a narradora foi trancada quando ainda era pouco mais que um bebê, cresceu sem referências de carinho físico e de conceitos como privacidade.

É a partir desta personagem que o leitor não só conhece o universo distópico, mas também tem uma visão sobre aquela situação a partir do contraste. A estratégia é semelhante à usada por José Saramago em “Ensaio sobre a cegueira”, onde a narrativa é feita a partir da perspectiva da única pessoa que não perdeu a visão.

Dessa forma, enquanto as outras 39 mulheres sofrem de saudade e se distraem com as memórias de suas vidas, Pequena se desenvolve sem referências básicas. A autora, que é psicanalista, faz o leitor se questionar sobre o que é intrínseco à humanidade e o que depende de construções sociais.

Jacqueline Harpman tem origem judaica e sua família teve que fugir do nazismo. É possível fazer uma leitura do livro como uma alegoria do holocausto, que sem nenhuma justificativa privou milhões de seres humanos de sua dignidade.

É importante dizer que, assim como no livro de Saramago, “Eu que nunca conheci os homens” não se propõe a explicar o cataclismo. Mesmo alimentando esse mistério através dos diálogos entre as personagens, a obra é muito mais sobre as consequências daquela situação na mente e suas implicações no conceito de humanidade. Ao mesmo tempo, acontecem várias surpresas que fazem a leitura fluir com rapidez. Reflexivo, provocativo e inteligente, “Eu que nunca conheci os homens” vale muito a pena.

Marina Zanaki

Repórter do LIBERAL, a jornalista Marina Zanaki é aficionada pela literatura e discutirá, neste blog, temas relacionados ao universo literário.